Maputo (O Destaque) – O Presidente da República, Daniel Francisco Chapo, lançou hoje, em Maputo, um apelo veemente pelo reforço da capacidade de produção local de medicamentos em África.
O Chefe de Estado moçambicano defendeu que esta é uma medida importante para alcançar a desejada soberania sanitária no continente, alertando para os perigos da dependência externa que coloca os nossos sistemas de saúde numa posição vulnerável e ameaça o direito fundamental à saúde dos povos africanos.
As declarações foram proferidas na abertura da Conferência Internacional sobre a Produção Local, Investigação e Desenvolvimento de Medicamentos e Produtos de Saúde, um evento de dois dias que reúne especialistas e decisores na capital do país.
Chapo destacou um paradoxo gritante: África suporta cerca de 25% da carga global de doenças, mas enfrenta uma escassez alarmante de profissionais de saúde e uma produção farmacêutica quase inexistente.
O Presidente Chapo sublinhou que, embora o mundo testemunhe rápidas transformações sanitárias e epidemiológicas, é em África que o peso das doenças se faz sentir de forma mais acentuada.
“O mundo tem vindo a assistir rápidas transformações sanitárias e epidemiológicas […]. Contudo, é em África, nosso continente, que o fardo da doença continua mais pesado, com cerca de 25 por cento da carga global de doença”, declarou.
A fragilidade do continente é ainda mais evidente quando se observa a dependência quase total do exterior.
O Chefe de Estado lamentou que cerca de 90 por cento de todos medicamentos e produtos de saúde que a África consome são produzidos em outros continentes. Esta situação torna os países africanos excessivamente dependentes e expostos a flutuações do mercado internacional, atrasos logísticos, crises geopolíticas e restrições orçamentais, comprometendo seriamente a capacidade de resposta a crises de saúde.
A pandemia da COVID-19 serviu como uma recordação dessa vulnerabilidade.
Daniel Chapo recordou a longa espera de África pelas vacinas, uma espera que evidenciou a posição desfavorecida do continente na corrida global por recursos essenciais.
“A África teve que esperar muito tempo para receber as vacinas através de gestos de boa vontade de alguns países, depois de os mesmos atenderem as suas necessidades internas”, afirmou, expondo a amarga realidade de uma solidariedade tardia.
Para além da dependência, o Presidente denunciou outro flagelo que assombra a saúde pública africana: a proliferação de medicamentos falsificados e contrabandeados. Entre 2013 e 2017, 42% dos incidentes globais com medicamentos contrafeitos ocorreram em África, um dado que acende um sinal de alarme.
“O roubo de medicamentos, o contrabando transfronteiriço e a proliferação de medicamentos contrafeitos são uma ameaça real à saúde pública”, advertiu.
Um farmacêutico que actua há mais de 20 anos na província de Nampula, que preferiu não ser identificado, expressou a sua preocupação com este problema.
“É uma luta diária. Recebemos casos de pacientes que não melhoram porque usaram medicamentos que não fazem efeito. Este sistema [de rastreabilidade] é uma luz ao fundo do túnel para nós que estamos na linha da frente.”
Face a este cenário desafiador, o Presidente Chapo destacou as iniciativas de Moçambique para inverter o quadro. Entre as medidas, salientou o Programa Nacional de Industrialização (PRONAI), a criação de zonas económicas especiais e o reforço da Autoridade Nacional Reguladora de Medicamentos (ANARME).
“Pretendemos criar condições para atrair investimento, promover parcerias público-privadas, fortalecer o parque industrial farmacêutico e garantir que a indústria nacional seja uma aliada da saúde pública”, referiu, traçando um caminho ambicioso para o desenvolvimento do sector.
O anúncio mais marcante da sua intervenção foi, sem dúvida, o início oficial da implementação do Sistema Nacional de Rastreabilidade de Medicamentos e Produtos de Saúde. Este sistema inovador, conhecido internacionalmente como “Track & Trace”, promete revolucionar a forma como os medicamentos são controlados no país.
“Portanto, a partir de hoje os medicamentos estão com um selo de rastreio, desde o fabrico até ao paciente“, disse o Presidente, explicando que o sistema permitirá identificar a origem e o percurso de cada medicamento.
A tecnologia por trás do “Track & Trace” permitirá a Moçambique combater eficazmente o contrabando e o uso de medicamentos adulterados. Além disso, a ferramenta vai melhorar a gestão de stocks e aumentará a transparência em todo o sector farmacêutico, desde a produção até à distribuição final.
“Estamos assim a dar um passo histórico para garantir que cada medicamento que chega ao cidadão moçambicano seja seguro, rastreável e autêntico em termos de qualidade”, enfatizou o Presidente, com uma nota de optimismo.