Divisas Escassas Levam Banco Central a Intervenção Inédita na Saúde

Maputo (O Destaque)-
Em um cenário de crescente pressão econômica, a falta de moeda estrangeira no país tem forçado o Banco de Moçambique (BM) a adoptar uma postura incomum no setor da saúde. A escassez de divisas nos bancos comerciais, um obstáculo para a importação de medicamentos e equipamentos médicos essenciais, levou o regulador financeiro a assumir temporariamente o papel de intermediário de pagamentos internacionais.

A medida, anunciada após um encontro com o Ministro da Saúde, Ussene Hilário Isse, direciona os importadores a encaminharem suas necessidades de pagamento directamente à Central de Medicamentos. Este órgão, utilizando sua conta em moeda estrangeira no próprio Banco de Moçambique, realizará os pagamentos aos fornecedores estrangeiros, maioritariamente localizados na Índia.

Essa intervenção directa do banco central, embora vista como uma solução emergencial, representa um desvio da dinâmica tradicional do sistema financeiro, onde as transações internacionais são conduzidas pelos bancos comerciais. A iniciativa levanta questionamentos sobre a capacidade do BM de sustentar essa função operacional e as possíveis implicações para o futuro do mercado cambial.

O sector farmacêutico local já sente os impactos da crise, com a Associação dos Importadores e Produtores de Medicamentos de Moçambique (AIPROMEM) reportando uma queda significativa nas importações no primeiro trimestre de 2025. A presidente da AIPROMEM, Mariamo Aly Hassane, em declarações, alertou para o risco iminente de desabastecimento de medicamentos, caso a situação não se normalize.

A dificuldade na emissão de termos de compromisso por parte dos bancos comerciais, receosos em não conseguir honrar os pagamentos em prazos acordados, agrava ainda mais o cenário. Essa hesitação bancária, segundo a AIPROMEM, paralisa o desembaraço aduaneiro de cargas já adquiridas, mesmo aquelas com prazos de pagamento estendidos.

Economistas, como Egas Daniel, alertam que a actuação do Banco de Moçambique, embora motivada pela urgência, pode gerar distorções no mercado cambial, com riscos de descontrole das taxas de câmbio. A Confederação das Associações Económicas (CTA) também expressou preocupação, indicando que as medidas de contenção da inflação podem estar exacerbando a falta de divisas, com um acumulado de cerca de 500 milhões de dólares em pagamentos pendentes reportados pelos bancos comerciais.

A crise de divisas, com seus efeitos cascata na produção, nos custos operacionais e no investimento privado, expõe a fragilidade de setores cruciais como a saúde, onde a continuidade do acesso a bens essenciais é uma questão de vida ou morte. A intervenção do Banco de Moçambique sinaliza a gravidade da situação e a busca por soluções inovadoras em tempos de turbulência econômica.

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