Maputo (O Destaque) -No vibrante cenário das celebrações dos 50 anos do Banco de Moçambique e dos 45 anos do Metical, a capital do país tornou-se palco de um encontro de alto nível, reunindo os governadores dos bancos centrais dos 16 Estados-membros da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC). O fórum, que decorre hoje, configura-se como uma plataforma essencial para a reflexão aprofundada sobre os intrincados desenvolvimentos económicos que moldam a região, bem como para a análise perspicaz do impacto das recentes tensões políticas que ecoaram em alguns países membros.
Rogério Zandamela, o anfitrião e Governador do Banco de Moçambique, abriu os trabalhos partilhando um panorama da conjuntura económica. Em tom ponderado, Zandamela reconheceu os “desafios” impostos por “uma adversidade doméstica e global” no último ano, que resultou numa desaceleração da actividade económica, passando de um robusto crescimento de 5,4% em 2023 para modestos 1,9% em 2024. O governador não hesitou em apontar o dedo às “tensões pós-eleições” como um factor de peso nesta desaceleração, causando uma “paralisação parcial da produção doméstica em diferentes sectores de uma economia já frágil”. Zandamela detalhou o impacto no último trimestre de 2024, onde o Produto Interno Bruto (PIB) real registou uma significativa travagem de “quase 5%, 4,9% para ser preciso”.
Contudo, nem tudo foram nuvens no horizonte traçado por Zandamela. Com uma nota de satisfação, o governador partilhou o sucesso da instituição na manutenção da “estabilidade de preços”, um pilar fundamental do seu mandato. A inflação anual apresentou uma trajectória descendente notável, recuando de 7% em 2023 para 3,2% em 2024, um feito que Zandamela atribuiu a uma “posição de política monetária prudente”, à estabilidade da taxa de câmbio e à desaceleração dos preços internacionais de alimentos e combustíveis. Os dados mais recentes, referentes a Abril de 2025, confirmam a persistência desta tendência de baixa inflação, fixando-se nos 3,5%.
Apesar dos progressos no controlo da inflação e na estabilização da moeda nacional, Zandamela não deixou de sublinhar os desafios estruturais que persistem na economia do país. A “fraca diversificação económica”, a “alta dependência da economia no sector público”, as “deficiências de infraestrutura pública” e a vulnerabilidade a “choques exógenos, tanto domésticos quanto internacionais” foram apontados como obstáculos que exigem “esforços adicionais” para alcançar os indicadores de convergência macroeconómica da região.
A agenda do encontro em Maputo não se cingiu à análise da situação. Temas de vanguarda como a “adopção da inteligência artificial na gestão dos bancos centrais”, a “criação de um sistema regional de pagamentos” e as complexas “implicações das tensões geopolíticas na política monetária” também figuram entre os pontos de discussão.
Lesetja Kganyago, Presidente do Comité de Governadores da SADC, ofereceu uma perspectiva regional e global, alertando para a inevitabilidade do impacto da geopolítica, mesmo para instituições tecnocráticas como os bancos centrais. Com particular atenção, Kganyago abordou o “futuro incerto do Acordo de Crescimento e Oportunidades da África (AGOA)”, com expiração prevista para Setembro de 2025. Num tom pragmático, desaconselhou depositar demasiada esperança na sua renovação, exortando a região a “tomar acção rápida em avaliar o impacto resultante, contendo os riscos e acelerando a implementação de políticas intrarregionais”, como a Área de Comércio Livre Continental Africana (AfCFTA), enquanto se procuram “respostas alternativas”. O Presidente do Comité sublinhou ainda a “crucial” necessidade de os bancos centrais se envolverem em discussões e explorarem estratégias para responder às “mudanças climáticas”.
Este encontro em Maputo reforça o papel vital do Comité de Governadores dos Bancos Centrais da SADC como plataforma de coordenação de políticas monetárias na região. Criado em 1995 no âmbito do processo de integração regional, este fórum continua a ser um espaço privilegiado para o diálogo estratégico entre os líderes das instituições monetárias da África Austral, num momento em que os desafios económicos e geopolíticos exigem respostas concertadas e inovadoras. A celebração dos marcos históricos do Banco de Moçambique e do Metical serve assim de pano de fundo para um debate essencial sobre o futuro económico da região, com Maputo a afirmar-se como um centro de reflexão e construção de soluções para os desafios que se avizinham.
